Equipe econômica, comandada por Paulo Guedes, recebe cobranças de ministros sobre liberação de recursos |
Os caminhos da retomada econômica pós-pandemia de coronavírus e a tentativa de projetar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro, já mirando a campanha de 2022, vêm aumentando a pressão no governo pelo aumento dos gastos públicos. Um grupo liderado pelos ministros Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura) defende que a União gaste mais já a partir deste ano, receita combatida pelo titular da Economia, Paulo Guedes.
As viagens de Bolsonaro ao Piauí, Rio Grande do Sul e à Bahia nos últimos dias são parte da estratégia de aumentar a presença em eventos para celebrar intervenções realizadas pelo governo. Para manter uma agenda extensa e montar uma carteira de obras públicas robusta, no entanto, vai ser necessário gastar mais do que o espaço atualmente reservado no Orçamento para esse objetivo, sob risco de deteriorar a já complicada situação fiscal.
A disputa também passa pelo tamanho do Renda Brasil, programa que vai substituir o Bolsa Família e virou o trunfo de Bolsonaro para conseguir melhorar sua aprovação e se reeleger. As discussões têm se acentuado nas últimas semanas, porque o governo envia este mês ao Congresso a proposta orçamentária de 2021. O pagamento do auxílio emergencial para desempregados e trabalhadores informais prevê cinco parcelas de R$ 600 — quem começou a receber em abril, na primeira leva, receberá a última em agosto.
De acordo com as previsões iniciais da equipe econômica, os valores reservados para os investimentos continuarão em baixa, o que tem irritado integrantes da Esplanada dos Ministérios. O teto de gastos limita o crescimento das despesas federais à inflação do ano anterior. Uma vez que as despesas obrigatórias, como pagamento de salários e aposentadorias, crescem mais que a inflação, o espaço para investimentos tem ficado menor a cada ano.
O racha ficou explícito durante uma reunião em meados de julho, com discussões sobre a possibilidade de gastar cerca de R$ 35 bilhões com obras fora do teto de gastos e além do que já estaria previsto no Orçamento. Para efeito de comparação, a previsão orçamentária do Ministério da Infraestrutura para investimentos e manutenção da máquina em 2021 é de R$ 6,3 bilhões, segundo dados obtidos pelo GLOBO. Já a despesa do Ministério do Desenvolvimento Regional seria de R$ 5,2 bilhões, reservada para obras como de infraestrutura hídrica.
Na sexta-feira, em Bagé (RS), numa sinalização de que concorda com o ministro do Desenvolvimento Regional, Bolsonaro afirmou que, “pelo menos uma vez por semana”, sairá de Brasília para percorrer o país:
— O que eu sempre falei com meu ministro, o Marinho, é não deixar obra parada. Temos problemas de Orçamento? Temos. Estamos tentando arranjar recursos para que as obras sejam concluídas.
Guedes resiste
A possibilidade levada por Marinho ao Palácio do Planalto consistia em empenhar todos os recursos necessários em 2020, porque as regras orçamentárias estão mais frouxas por conta da necessidade de gastar para conter os efeitos da pandemia. Os valores, no entanto, seriam pagos ao longo dos próximos anos. O empenho é a primeira etapa do processo orçamentário, pelo qual o governo garante que vai pagar pelo serviço.
Guedes é contra a ideia. Ele entende que o sinal passado com uma eventual burla ao teto de gastos seria péssimo, com repercussão sobre a situação econômica do país. O ministro argumenta que é mais importante construir regulamentos que permitam a ampliação do capital privado e que os R$ 35 bilhões não seriam suficientes para recuperar a atividade econômica. Na semana passada, a agência de classificação de risco Moody’s alertou que uma eventual elevação do teto prejudicaria a nota do Brasil e levantaria dúvidas sobre a trajetória da dívida.
Sem conseguir costurar um consenso no governo e no Congresso sobre o tema, o ministro do Desenvolvimento tentou convencer o titular da Casa Civil, Walter Braga Netto, a consultar o Tribunal de Contas da União (TCU) para que a Corte avalizasse o aumento de gastos. Braga Netto tem feito a ponte entre Guedes e a ala favorável a mais gastos.
O desejo pela liberação de mais recursos esbarra também no presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Diante desse cenário, ministros do TCU decidiram não se envolver na polêmica. Consultados informalmente, integrantes do tribunal avisaram o governo que qualquer decisão a respeito dependeria de um acordo prévio entre Executivo e Congresso, já que deputados e senadores teriam de aprovar um projeto de remanejamento de recursos.
Atritos constantes
O assunto colocou Guedes e Marinho novamente em lados opostos. Os dois já haviam discordado na criação do Pró-Brasil, programa também com propósito de reduzir os impactos econômicos ao fim da pandemia. À época, Guedes queixou-se com Bolsonaro de que Marinho havia costurado a criação do Pró-Brasil sem a participação da Economia e comparou a iniciativa ao Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC) dos governos petistas.
Segundo integrantes do Palácio do Planalto, Braga Netto tem trabalhado para diminuir atritos entre os ministros e conciliar assuntos que provoquem polêmicas. Por isso, a Casa Civil decidiu não fazer a consulta sobre o aumento de gastos ao TCU e agora busca uma nova saída para que o governo possa seguir o plano de Marinho para impulsionar as obras.
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