Reverter os impactos negativos causados pela pandemia da Covid-19 na Educação será um dos maiores desafios do Poder Público, das instituições de ensino e dos pais em 2021. Para especialistas na área ouvidos pelo Diário do Nordeste, as prioridades devem ser o combate à evasão escolar e à inacessibilidade em relação a tecnologias da informação. Nesse contexto, o ensino híbrido deve ser fortalecido e deve haver políticas sociais associadas às escolas.
Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Covid-19), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 43 mil pessoas com idades entre 6 a 16 anos, que frequentam escola no Ceará e não estão tendo aulas presenciais normalmente, não tiveram atividades disponibilizadas em novembro. O dado mostra de forma concreta as desigualdades educacionais que foram acentuadas ainda mais com a crise sanitária.
Para Ivan Gontijo, especialista em Políticas Educacionais, a pandemia foi além e não só aprofundou problemas antigos, como criou novos. Ele alerta que essas desigualdades devem persistir em 2021. A fim de minimizar esses efeitos, Ivan – que também é coordenador de projetos da organização Todos Pela Educação – frisa que o retorno às aulas presenciais neste ano deve ter dois focos práticos: a recuperação do conteúdo e o acolhimento seguro dos estudantes, com a adoção de medidas sanitárias contra a proliferação do novo coronavírus.
Ivan Gontijo teme que a recuperação do conteúdo não seja o termo mais adequado para a situação uma vez que muitos precisem partir do zero. “A gente usa, muitas vezes ‘reforma’ para se referir ao que necessitam nossos alunos, mas acontece que muitos deles não tiveram nem o primeiro acesso de muitos conteúdos durante este ano”.
Retorno
A avaliação da vice-presidente do Conselho Estadual de Educação (CEE) do Ceará, Lúcia Veras, vai ao encontro dos apontamentos de Ivan, e a representante defende a continuidade do ensino híbrido neste ano.”Como já está havendo uma abertura, deve-se manter o ensino híbrido, com apenas parte dos alunos na escola, para evitarmos uma alta nos números de contaminação”, destaca.
Para ela, todas as etapas de ensino (Infantil, Fundamental e Médio) foram impactadas igualmente. “A questão agora é o prosseguimento e a adequação do currículo a este novo momento”, une.
Todos os especialistas se aliam ao retorno gradual e seguro para os professores, famílias e alunos. Alternativas como o 4° ano do Ensino Médio também foram citadas, bem como o aumento de autonomia e compromisso do estudante em relação à escola. Os desafios abrem diversas oportunidades de reversão da qualidade da Educação brasileira.
Para o retorno, Lúcia enxerga auxílio numa força-tarefa entre as pastas da Saúde, Educação e Assistência Social. “As escolas não devem trabalhar sozinhas. Precisamos de planos de ensino eficazes, juntos de protocolos sanitaristas avaliados dia a dia, para mantermos um padrão de excelência no acompanhamento dos professores, alunos e famílias”, acrescenta.
O professor de Pedagogia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Luís Távora, reforça que, para avançar na educação, é preciso atacar problemas sociais, garantindo bolsas e auxílios.”Problemas sociais bastante concretos atrapalham a superação dos desafios da Educação. Auxílios devem ser a saída, assim como concessão de bolsas para estudantes em situação de vulnerabilidade”, pontua.
Ivan Gontijo exemplifica um trabalho da assistência social: “seria, num sistema de revezamento, garantir a merenda aos estudantes faltosos naquele dia. Uma possibilidade de acompanhamento seria pelos cartões de famílias do Cadastro Único (CadÚnico) do Governo Federal”. Urgente também, para ele, é a resolução da evasão escolar. “Eu destacaria uma política que tentasse evitar que os alunos não retornem, precisamos de programas de busca ativa para trazê-los de volta”, frisa.
Tecnologias
A importância das Tecnologias de Informação e Comunicação para a democratização do ensino e do aprendizado devem continuar sendo um diferencial. É o que garante Xênia Diógenes Benfatti, pesquisadora e professora do Centro de Ciências da Comunicação e Gestão da Universidade de Fortaleza (Unifor).”O acesso às tecnologias dividiu os cenários. Em 2021 será necessário criar condições para assegurar que quem ficou à margem neste ano possa ser incluído com qualidade”.
O professor Luís Távora reforça a ideia de que é preciso uma rede de apoio em relação a equipamentos tecnológicos e internet. Mas, segundo ele, as práticas virtuais do ano atípico de 2020 devem levar a uma melhora de aprendizagem remota no próximo ano. O que deve ser prioridade é o apoio pedagógico, com “as aulas e conteúdos objetivos, de tempo mais breve e atividades resumidas”.
De acordo com Luís, os ensinos Fundamental e Médio devem diminuir a carga burocrática dos professores, como relatórios, lista de frequência, e documentações desnecessárias. “Os professores devem se concentrar na questão didática, pensando no conteúdo de forma criativa”. Diferente do que pensa a pesquisadora Xênia Diógenes, que acredita que frequências e processos avaliativos não podem ser colocados em segundo plano.”Esses são os momentos de acompanhamento do aprendizado do aluno. Já os ignoramos, de alguma forma, durante esse ano. E isso foi muito grave. Em 2021, os estudantes precisam aprender a não se prepararem para decorar conteúdos e acertar questões, mas sim para que sejam sujeitos transformadores, que interpretam dados, e que produzem novos conhecimentos”.
Ensino Infantil
De acordo com o professor Luís Távora, a relação de segurança do professor com o aluno é essencial no processo de aprendizagem. Essa relação deve ser ainda mais forte no Ensino infantil. É por isso, acredita Xênia Diógenes, que os pequenos foram ainda mais impactados com o ensino remoto. “Nossas crianças precisam, de fato, de um ambiente necessário e primordial para a socialização. Muitas mães também se preocuparam, por terem de ir trabalhar e não ter onde deixar os filhos em condições ideais”.
O retorno às aulas presenciais deve ser urgente, sobretudo para os pequenos, defende a especialista. “A creche e a escola tiveram atividades praticamente inviabilizadas durante o período de isolamento social. A gente sabe que a sociabilização é importante. Imagina uma criança de dois ou três anos que passou o toda a pandemia sem conviver com outra criança”, defende.
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